O Que É Arte?
Sob todos os pontos de vista, O homem do casaco vermelho é um livro que comprova que a realidade pode de fato ultrapassar a ficção. Somente Julian Barnes seria capaz de semelhante façanha: a partir da análise do retrato pintado de um médico francês – célebre em seu tempo, porém desconhecido do público atual –, elaborar um esplêndido e abrangente mosaico da cultura francesa e inglesa do começo do século XX. O homem do casaco vermelho não tem apenas um protagonista, o pioneiro da moderna ginecologia Dr. Samuel Jean de Pozzi, e sim uma verdadeira constelação de estrelas das letras, das artes cênicas, das artes plásticas e, evidentemente, da medicina que quebraram todos os paradigmas criativos e comportamentais da época, desbravando caminhos que ainda trilhamos hoje em dia. Sarah Bernhardt, o maior mito do teatro de todos os tempos, foi uma das suas muitas amantes; Adrien e Robert Proust (pai e irmão do escritor) foram seus colegas médicos, enquanto o próprio Marcel foi seu amigo, assim como Oscar Wilde, o conde Robert de Montesquiou, Joris-Karl Huysmans e Jean Lorrain, todos precursores no combate à homofobia. Por intermédio de John Singer Sargent, autor da pintura que dá título ao livro, e do próprio Dr. Pozzi (grande colecionador), Julian Barnes aborda um dos seus temas preferidos: a arte, cuja análise ele transforma em radiografia de toda a sociedade. E ao analisar as vidas e as obras de outros escritores célebres, como Guy de Maupassant, Barbey d'Aurevilly, Gustave Flaubert e os irmãos Goncourt, ele compõe um esplêndido e irretocável painel da vida cultural da Belle Époque, no qual não faltam os toques dramáticos do modismo dos duelos e dos assassinatos de médicos por pacientes insatisfeitos.